Miséria

Olá pessoas!
Fazia tempo que não escrevia né? mas hoje é um dia especial.. um dia marcante na minha vida, e mais uma vez preciso compartilhar com vocês.
Depois de um dia de trabalho, passei na padaria perto do ponto de ônibus, comprei um bolo de aipim, 3 pães e 200g de presunto e mussarela para fazer um lanchinho quando chegasse em casa... fui para o ponto de ônibus para pegar o ônibus das 18h15, o circular do Prata para a minha cidade...
Entrei no ônibus, passei a catraca, e vi alguns poucos lugares vazios. Ao me lembrar do "trauma" do dia anterior quando sentei-me perto de um homem cheirando "suor vencido", vulgo cecê, preferi não arriscar em sentar nos bancos da frente onde o cheiro costuma "acumular", preferi sentar-me nos bancos próximos à catraca. Entre os poucos lugares disponíveis sentei-me ao lado de uma senhora. Logo em seguida pensei: "bad choice again Rose!" a senhorinha parecia uma mendiga. Inicialmente pensei: "não posso dar bobeira se não ela pode tascar minha bolsa". Logo abortei essa possibilidade, a senhorinha não me oferecia tanto perigo assim. Em seguida pensei: "ainda bem que ela não está cheirando tão ruim". O cheiro dela se assemelhava à roupas sujas guardadas por bom tempo num lugar sem ventilação. O cheiro era menos pior que o do dia anterior.
Não se assutem com os meus pensamentos, eles podem aparecer em qualquer mente quando menos se espera.
Passado esses "pré-conceitos" que tive sobre a senhorinha, passei a notar que ela me olhava, e me olhava de cima a baixo.
Antes de descrever-me no ponto de vista dela, irei descrever o meu ponto de vista sobre ela.
Uma senhorinha que dava metade de mim em estatura, e talvez uns 15kg mais magra que eu. Pele negra. Cabelos pretos com alguns grampos. Uma blusa de frio marrom. Uma calça preta. Ambas as peças pareciam de um veludo, mas talvez fosse apenas tecidos "embassados" de sujeira. Cheias de pó. Se é que posso usar a expressão "cinza" para o marrom da blusa e o preto da calça. Um chinelo preto também sujo. Unhas das mãos e dos pés compridas e um pouco sujas. Em sua mão esquerda, segurava uma sacolinha de pão.
Acho que quando ela olhou pra mim, ela deve ter se sentido "desconfortável". Uma moça de pele branca, cabelos loiros e lisos, blusinha estampada bonita, calça jeans, sapatilha "da moda" nos pés, uma bolsa vermelha grande, um casaco de lã cinza, segurando também uma sacolinha de pão.
Pensei: "sacolinha de pão. Uma coisa em comum". Duas coisas em comum: "sentadas no mesmo banco de um ônibus circular para o mesmo destino".
Em seguida pensei: "diante de Deus somos todos iguais..." E comecei a pensar: "quantas pessoas será que viram essa senhorinha e preferiram se sentar em outro banco?"... "porque eu sentei ali?"...
Eu percebi que ela olhou para a minha sacola, na verdade duas, porque a outra estava com o bolo, e ela se ajeitou no banco, olhando para fora da janela do ônibus.
De repente ela se vira para mim e me pergunta: "Será que eu pego o Estrela aberto?" se referindo ao supermercado próximo ao ponto final do ônibus. Respondi: "Acredito que sim, o Estrela fechas as oito né?". Foi a conversa inicial para tudo o que ela iria me falar.
Ela disse: "É pro meu neto, sabe, ele pede as coisas pra mim, esses dias ele falou: vó traz salame." ela riu e continuou: "ele não cresce, sabe, ele não cresce... ele é branquinho, o único branquinho de casa, puchou o lado do pai dele sabe, em casa é tudo escurinho assim como eu, mas não gosto quando o pai dele bate nele e não posso falar nada porque tenho medo, porque ele é violento... sabe sou mãe de 11 filhos e nunca bati em nenhum filho, não tem porque bater, não gosto que batem, eu fico nervosa..." vi a angustia no rosto sujo dela, como se cenas de violência fossem comum no lar dela, e vi o olho dela se encher de lágrimas.
Ela continuou: "Sabe, o meu vizinho também bate na filhinha dele, ela é linda, branquinha também, e se ela chora por qualquer coisa, ele bate nela e fala "porque você ta chorando menina, pára de chorar" e bate mais nela... outro dia ele bateu na outra filha de 11 anos, bateu muito, precisa ver que dó, o nome dele é (e falou o nome do homem), filho do (falou o nome do pai do rapaz) que trabalha na prefeitura, mas o nome dele é (e repetiu o nome do rapaz)... a menina chorava tanto e gritava o meu nome da casa dela, mas o que eu podia fazer? Ai que nervoso!" E ela falava novamente com angustia no rosto, como se ela me dissesse quem era o rapaz, eu o poderia entregar para a polícia ou algo assim.
Eu não sabia muito o que dizer. E apenas concordava: "que dó... não pode bater tanto em criança assim né?". Eu estava espantada com a forma que ela me dizia e tentando compreender qual o propósito de eu estar ao lado dela ouvindo tudo aquilo...
Acredito que ela percebeu que eu não tinha muito o que dizer e olhou para fora da janela do ônibus e se calou.
Eu também me calei porque não sabia o que dizer nem o que fazer. Fiquei pensando a viajem toda qual o propósito de estar sentado ao lado daquela senhorinha tão pobre, tão sofrida na vida, e por ela ter me contado tantas coisas em poucos minutos.
Pensei se não era um Jesus sentado ao meu lado no ônibus. Pensei em dar para ela o bolo que eu tinha comprado para mim. Ela apertava tão forte a alça da sacolinha de pão e tinha um olhar tão perdido para a fora da janela... Pensei sobre o que ela poderia estar pensando. Pensei no que ela quis dizer com aquelas palavras. Orava em pensamento para entender aquela situação...
O resto da viajem viemos em silêncio.
Quando estava próximo do ponto que eu ia descer, abri minha bolsa, peguei 20 reais da minha carteira. Perguntei a ela: "qual o nome da senhora?" Ela me respondeu o nome completo. Disse a ela: "senti no meu coração de dar esse dinheiro pra senhora, que Deus abençoe a senhora e a familia da senhora com paz e alegria.." ela cortou o que eu estava dizendo pra me dizer: "Sabe moça, eu não tenho comida em casa, mas fui pra Bauru e ganhei um saco de pão e dois reais que vou ver se acho o mercado aberto pra comprar um litro de leite pras crianças" e me mostrou os dois reais amassados que estava na mão dela... eu disse a ela: "que a senhora possa comprar mais coisas no mercado para comer..." ela me cortou novamente e me disse: "eu estou com uma dor aqui do lado que nem consigo me mexer, e na minha barriga tem um buraco de fome..." dessa vez eu que cortei o que ela estava dizendo para dizer: "que Deus abençoe a senhora com cura em nome de Jesus... tenho que descer agora..." me levantei e ela disse: "que Jesus a abençoe muito filha"...
Desci do ônibus muito triste. a única coisa que eu disse pra Deus foi: "Perdão Deus! Misericórdia! eu deveria ter dado todo o dinheiro! Que o Senhor abençoe essa senhorinha, que a salvação do Senhor alcance esse lar..."
E quando ia pra casa o Senhor ministrou muito no meu coração.
Quem é mais miserável? eu sou mais miserável que aquela senhorinha. Hesitei em dar tudo, medi uma medida apenas. Gasto 20 reais com futilidades e ela não tinha comida para comer. Eu peço um carro para Deus, peço condições de viajar, peço mais dinheiro para Deus.... pra fazer o quê? E ela nas condições tão precárias da vida dela não me pediu nada, mesmo não tendo comida na casa dela... Não sei como é a casa dela, não sei o que ela foi fazer em Bauru, nem como conseguiu o dinheiro da passagem. Mas o que me importa saber diante de tudo o que Deus me falou nessa situação?
Como sou egoísta! Peço para mim, para os meus próprios deleites, e não peço nada para os que realmente não tem o que comer.
Como reclamo das coisas que tenho! E não páro para refletir que MUITOS não tem nada do que eu tenho... reclamo de uma carne que está dura e não me importo em quem vai passar o dia com pão e leite...
Reclamo que preciso comprar roupas, e não me importo com quem não tem sabão e água em casa para lavar uma roupa velha.
Critico muitas vezes meus pais que são tão amorosos e não me importo com as crianças que são espancadas em seus próprios lares, pelos próprios pais.
Deus se importa mais com ela do que comigo... Uma filha dEle que sofre, que padece, que tem fome de alimento e fome de justiça.
A miséria de atitude e de espírito é pior do que a miséria financeira.
Quantas vezes ajudamos o próximo e quantas vezes pedimos ajuda a Deus? Miseráveis...
Quanto mais temos, mais pedimos, por ganância e egoísmo. Quantas vezes o que não tem nada se cala por desesperança que alguém o ajude?
"Pois dizes: Estou rico e abastado e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu." Apocalipse 3:17
"Pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos próprios prazeres" Tiago 4:3
"Seja a vossa vida sema avareza. Contentai-vos com as coisas que tendes" Hebreus 13:5
"O Rei, respondendo, lhes dirá: Em verdade vos afirmo que, sempre que o fizestes a um destes pequeninos irmãos, a mim o fizestes." Mateus 25:40
"Semeia pela manhã a tua semente e à tarde não repouses a mão, porque não sabes qual prosperará; se esta, se aquela ou se ambas igualmente serão boas" Eclesiastes 11:6
"...mais bem aventurada coisa é dar do que receber" Atos 20:35b
Que possamos aprender a sermos menos miseráveis. Digo isso por mim. Que tenhamos coração deliberado e não criar pré conceitos por aparências.
Deus olha o coração das pessoas. Que ele não se decepcione com o nosso.
Ótima semana a todos!
Rosana Laus
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